Este livro é uma biografia com uma perspectiva original sobre a história do ditador português. É a sua História escrita de dentro para fora e não de fora para dentro, como quase sempre se faz. Muita gente olha para os factos históricos à luz dos conceitos de hoje. Falamos de colonialismo com base nas ideias de hoje.
Somos, enfim, quem sempre quisemos ser. E todavia, não estando já na África, nem na Europa, onde nunca seremos o que sonhámos, emigrámos todos, colectivamente, para Timor.
É lá que brilha, segundo a nova ideologia nacional veiculada noite e dia pela nossa televisão, o último raio do império que durante séculos nos deu a ilusão de estarmos no centro do mundo. E, se calhar, é verdade.
Baseado em acontecimentos verídicos, Um Milionário em Lisboa conclui a espantosa história iniciada em O Homem de Constantinopla e transporta-nos no percurso da vida do arménio que mudou o mundo - confirmando José Rodrigues dos Santos como um dos maiores narradores da literatura contemporânea.
Kaloust Sarkisian completa a arquitectura do negócio mundial do petróleo e torna-se o homem mais rico do século. Dividido entre Paris e Londres, cidades em cujas suítes dos hotéis Ritz mantém em permanência uma beldade núbil, dedica-se à arte e torna-se o maior coleccionador do seu tempo.
Mas o destino interveio.
O horror da matança dos Arménios na Primeira Guerra Mundial e a hecatombe da Segunda Guerra Mundial levam o milionário arménio a procurar um novo sítio para viver. Após semanas a agonizar sobre a escolha que teria de fazer, é o filho quem lhe apresenta a solução:
Lisboa.
O homem mais rico do planeta decide viver no bucólico Portugal. O país agita-se, Salazar questiona-se, o mundo do petróleo espanta-se. E a polícia portuguesa prende-o.
O Homem de Constantinopla reproduz a extraordinária vida do misterioso arménio que mudou o mundo - e consagra definitivamente José Rodrigues dos Santos como autor maior das letras portuguesas e um dos grandes escritores contemporâneos.
O que se conta neste livro é a história de vida - nascimento, agonia e loucura - do credenciado Pierre Bonnechance, aquele que era o único preto da cidade de Leiria. Mas também o mais bem vestido, o mais perfumado, e que fazia dele um preto mais branco que os brancos. Gozou de um estatuto de privilégio, ancorado no seu amor devotado ao Estado Novo, de que se fez, desde a juventude, grande apoiante. O 25 de Abril desbancou-o desde estatuto, levando-o a mergulhar no fel da rejeição. Consegue recuperar quando, no velório de Torcato Bernardes (Os Manuscritos de Leiria, editado pela Gradiva), encontra a viúva Palmira João (Os Manuscritos de Leiria). É ela que o vai ajudar a superar a confusão do vale-tudo, segundo ele, que se instalou no país com o 25 de Abril. Mas a sorte não estava com ele, acabando Pierre Bonnechance num estado de delírio, vagabundeando pela cidade, citando as profecias de Isaías.
Tal como um nocturne de Chopin, pela narrativa perpassa uma aragem de melancolia, tristeza, soturnidade, mas também emoções límpidas e serenas que se desentranham da alma de qualquer ser humano que mantenha a sensibilidade intocada.